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  • Foto do escritorMaria Luiza Rückert

Carma, destino, reencarnação. A nossa exigência por explicações.



A grande característica de uma partida de futebol é o imponderável. Um lance fortuito pode decidir um jogo e, até, um campeonato inteiro. A nossa existência também é assim. Um lance infeliz e desastrado pode macular toda uma biografia. Quando nos deparamos com uma situação inusitada e imponderável, saímos buscando explicações. Queremos saber se o acontecido é resultante de um carma, se estamos cumprindo um destino ou se existe reencarnação. Vejamos os posicionamentos de quem se ocupou com essa pesquisa.


“Naturalmente conheço a hipótese indemonstrável do espiritismo, sem, porém admiti-la” (p. 44), “Nossa visão científica não hesita em classificar os relatos dos espíritos como emanações do inconsciente dos médiuns e dos que participam das sessões” (C. G. Jung, em Psicologia e religião oriental, p. 50).


Portanto, é o inconsciente dos participantes que cria o fenômeno auditivo e, até mesmo, o visual.


“Caminhando Jesus, viu um homem cego de nascença. E os seus discípulos lhe perguntaram: ‘Mestre, quem pecou, este ou seus pais, para que nascesse cego?’ Respondeu Jesus: ‘Nem ele pecou, nem seus pais; mas foi para que se manifestem nele as obras de Deus’” (João 9,1-3). E Jesus curou o cego de nascença.


Os israelitas não desenvolveram a medicina, a exemplo dos gregos. Os sacerdotes limitavam-se a diagnosticar e declarar impuro. Algumas práticas curativas são mencionadas, como em 2 Reis 5 e outra em 20,7. Diante de uma deficiência congênita, os rabinos haviam desenvolvido três hipóteses: 1) a pessoa deficiente pode ter cometido um pecado no ventre materno; 2) a pessoa deficiente pode estar pagando por um pecado da alma pré-existente [o judaísmo foi influenciado pelo helenismo]; 3) o Deus onisciente teria imposto um castigo por um pecado que a pessoa iria cometer mais tarde.


Nessa sociedade impotente diante da doença, Jesus não quis saber dessas especulações, que não mudam a triste realidade. Ele mostrou que uma doença é um desafio – “para que se manifestem as obras de Deus”. Jesus não perdeu tempo com conjeturas; ele agiu. O mal não precisa ser explicado; ele deve ser combatido.


“Não se pode separar a ideia da reencarnação da ideia do carma. A questão decisiva é saber se o carma de um ser humano é ou não pessoal. Se o destino preestabelecido com que um ser humano entra na vida é o resultado de ações e realizações das vidas anteriores, existe então uma continuidade pessoal. Na outra hipótese, um carma é, por assim dizer, apreendido por ocasião do nascimento; incorpora-se novamente sem que haja uma continuidade pessoal”.


“Duas vezes os discípulos perguntaram a Buda se o carma do homem era pessoal ou impessoal. Duas vezes ele se esquivou a responder, evitando comprometer-se: conhecer a resposta, disse, não contribuiria para libertar o homem da ilusão do ser. Buda considerava que lhes era mais útil meditar sobre a cadeia dos nidanas, isto é, nascimento, vida, velhice e morte, causa e efeito dos acontecimentos dolorosos” (Jung, Memórias, sonhos, reflexões, p. 275).


“Ademais, por que deveríamos ser castigados por males dos quais não temos a mínima lembrança de os havermos cometido? [...] ‘Que proveito se há de esperar da punição se ninguém nos mostra qual foi nossa culpa? Em verdade, semelhante castigo vai contra o que pretende: irrita e leva à revolta’” (E. Gazaeus, citado por L. Boff, Vida para além da morte, p. 167).


“A lei do Karma envolve absurdidades que certamente os reencarnacionistas não subscreveriam: ‘Quando um amigo atraiçoa o outro, rouba-o, deixa-o na miséria, deveria ser abraçado por este com lágrimas de gratidão. Não lhe podia fazer um bem maior... Estava escrito. Ele o tinha merecido em outra encarnação’” (Kloppenburg, citado por L. Boff, Vida para além da morte, p 167).


“A perda da sensação de ainda ser sujeito humano é agravada pelo fato de a pessoa no campo de concentração experimentar-se a si mesma não só como mero objeto do arbítrio da guarda, mas também como objeto do joguete do destino” (Viktor Frankl, Um psicólogo no campo de concentração).


“A revolta contra o destino é paradoxal, como se pode ver claramente quando alguém pergunta o que teria sido dele se o seu verdadeiro pai não fosse quem realmente é, mas outro qualquer: pois, se alguém formula tal pergunta, é porque esquece que, nesse caso, não se trataria ‘dele’; que o portador do destino seria outra pessoa completamente diferente, de modo que nem já se poderia falar do ‘seu’ destino. O problema da possibilidade de um outro destino é, por conseguinte, em si impossível, contraditório e sem sentido”.


“À liberdade da vontade contrapõe-se o que há de fatal. Com efeito, chamamos destino precisamente a tudo aquilo que escapa essencialmente à liberdade do homem e que não fica sob o seu poder nem sob a sua responsabilidade”.


“A liberdade de decidir, o chamado livre-arbítrio, é coisa óbvia para o homem sem preconceitos, que tem a experiência vivencial e imediata de si, como ser livre”.


Frankl salienta que não nos compete sermos os questionadores do nosso destino. Nossa tarefa consiste em formular respostas às perguntas que o destino dirige a nós. A maneira como nós reagimos à doença, ao sofrimento e ao perigo e tudo o que fazemos e deixamos de fazer vem a ser a nossa resposta ao destino.


A partir de sua dimensão espiritual, o ser humano elabora respostas que não são apenas condicionadas por fatores emocionais da infância, ou por processos de aprendizagem do passado, ou pelo seu patrimônio genético. O ser humano não é um simples “aparelho de reação”, como muitas vezes pretende a psicologia. O ser humano pode elaborar respostas independentes de condicionamentos psicológicos ou hereditários, pois ele é responsável pelas suas atitudes. E quando as respostas espirituais se orientam para um sentido, elas não dependem de um destino sofrido, violento e obscuro.


Ao invés de perguntarmos o que nós podemos esperar da vida, devemos perguntar o que a vida espera de nós. Devemos formular respostas às perguntas que a vida dirige a nós.


Devemos sempre formular uma resposta à problemática da existência, sobretudo nas experiências de dor e de sofrimento. Quando uma pessoa é poupada de sua responsabilidade, então também lhe é subtraída sua dignidade.


O ser humano se depara com a auto-transcendência. Ele sai de si mesmo e realiza significados. Os valores estão fora e acima do ser humano, sendo tão importante a auto-transcendência.


Frankl emprega o conceito de “super-sentido” ou “meta-sentido”. O sentido último “deve ultrapassar a nossa capacidade de apreensão”. O temor diante do destino ou o sentimento de estar doente podem ser superados pela confiança num “super-sentido” / “meta-sentido”.


Frankl ressalta que “a fé religiosa é fé no supra-sentido, uma confiança no supra-sentido” (A presença ignorada de Deus, p. 60).


“Uma ideia do homem limitada à imanência não está completa. Ou bem o homem se concebe como a imagem de Deus, ou degenera em caricatura de si mesmo” (Frankl, A presença ignorada de Deus).


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